Arte do Zac Gorman, o cara é bom demais. |
Inclusive, me gera um incômodo tremendo a coincidência que é eu ter conhecido essa tirinha horas antes da minha primeira inesperada aventura, quase como se o desenrolar da história humana fosse premeditado por alguma entidade cósmica.
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As pessoas que me conheciam minimamente, provavelmente provaram de um estranhamento significativo com o meu novo interesse em sair de casa. Mas que a verdade seja dita, a minha vida era digna de um livro do Stephen King de tão chata e monótona que era (eu nunca vou superar esse trauma).
Mesmo tendo ciência disso, eu nunca fiz nada para resolver o problema, mas na ânsia que alguma coisa mudasse sem eu fazer nada, criei uma filosofia de vida, que é "eu não digo não para nada"; e eu adorava dizer isso em voz alta esperando que os quatro ventos carregassem essas palavras para ouvidos alheios na esperança de encontrar alguém que pudesse me tirar desse tédio devastador em que eu me encontrava.
Foi uma escolha meio patética, eu sei, mas funcionou, mesmo que dois anos depois. No dia sete de fevereiro de 2020 eu recebo uma mensagem de uma cara chamado JR (que terá um texto só seu no futuro) dizendo basicamente "mano, eu estou com um pé muito atrás sobre algo, você acha que eu deveria ir num show em Maricá com gente que eu conheci hoje?". Imaginando que ele tinha me chamado procurando um conselho, eu logo disse: "Com certeza, vá!"
Até aí eu não sabia que era muito mais que um simples e vago conselho que ele queria, o objetivo era, pasmem, me chamar. O convite me pegou de surpresa, claro. Entretanto, a surpresa se transformou em choque quando eu me toquei que estavam me chamando para um show de reggae, 50 km da minha casa e sem lugar para dormir. Mesmo que eu quisesse ir, ainda tinha uma barreira, minha mamãe tinha de deixar, e quando recebeu a proposta com bastante ênfase nas adversidades, obviamente negou.
Com certo alívio (eu era meio babaca) fui comunicar a JR que a minha mãe super malvada tinha me vetado de se divertir o tantão que a noite prometera. Mas, apesar disso, ele me convidou mais uma vez dizendo que se eu não fosse ele também não iria, falou também que a vida dele andava pacata e precisava de uma aventura. Aí que eu percebi que a parada era séria, então fui implorar para mamãe, com medo da reação, mas ela deixou. Vou assumir que usei algumas artimanhas de alto calibre antiético como esconder alguns fatos importantes e distorcer alguns outros.
As lembranças que crio desde que tenho 13 anos, têm um alto teor de fugacidade, e as desse dia não foram diferentes em nenhum aspecto. Porém, uma coisa nunca saiu da minha cabeça, que foi o meu encontro com a garota mais louca que eu já conheci. Eu não vou contar a história aqui porque o texto precisa ser conciso, mas acreditem, o título é muito merecido.
Mesmo com memórias bem doces desse final de semana, eu tenho medo do texto ficar muito grande, cansativo também, então eu encerro aqui sem desenvolver outras coisas que aconteceram, tipo: a primeira vez que eu vi alguém bolando um ao vivo, JR descontrolado vomitando encima da canga de uma moça, a primeira vez que cai de hoverboard e como eu conheci o pai de JR, que é um dos adultos mais legais que já vi.
Teatro
Mesmo com alguns empecilhos e contratempos, a primeira aventura foi muita divertida, tanto que eu acabei adquirindo gosto pela coisa. Depois desse dia, eu fiz um acordo que me garantia pelo menos uma aventura por mês com o humano já citado várias vezes até aqui, porque a sede por mais só aumentou.Agora já era certo que repetiríamos, mas sem a menor idéia* do que fazer, até o início das aulas de História da Arte (pode ir de short, para quem não sabia). Quando a professora falou que o Rio de Janeiro era a capital nacional do teatro, no segundo que ela disse isso, começou a tocar um alarme de incêndio na minha cabeça; eu sou carioca e nunca tinha ido ver uma peça. A percepção desse fato abalou o meu muito frágil patriotismo, que só existe porque eu nasci no RJ, essa terra maravilhosa.
Não muitos minutos de pesquisa depois, achamos uma peça no Teatro Riachuelo, uma releitura de Hamlet, que acabara de chegar de uma série de apresentações na China (se hoje é preocupante, na época era reconhecimento)
Eu não conseguiria te dizer o porquê do Rio ser a capital nacional do teatro, mas o que eu posso te dizer com certeza é que a cidade tem teatros lindíssimos. Não se compara minimamente com salas de cinema e torço para que isso seja incontestável.
Pela primeira e única vez, até agora, o destino da viajem foi melhor do que a viagem em si. A peça foi espetacular*, magnífica e todos os outros adjetivos que eu não consigo lembrar, mas que possam descrever a sensação inigualável que essa arte provoca.
A experiência é completamente diferente, foi mais intensa do que qualquer coisa que eu já tivesse experimentado, simplesmente mágica. O jeito que eles falam, absurdamente prolixos dialogando como se estivessem recitando um poema do início ao fim, junto da forma como eles se mexem e os monólogos super elaborados vão te imergindo na história até um desfecho extremamente impactante. Tudo foi tão marcante que lembro vividamente do quão arrepiado eu fiquei na última cena antes do intervalo.
Lembro também da sensação de total desprendimento da realidade no final da peça, quando você simplesmente levanta, bate palmas e de repente você não é mais um expectador, você tem um nome, objetivos na vida, reconhece uma imagem no espelho como você e têm pessoas que te conhecem; a confusão que isso me causou na hora foi absurda.
Considerações finais
Em suma, é tudo sobre a jornada, fazer algo pela primeira vez, encantar-se com a viagem, compartilhar com amigos e deixar que o acaso transforme a sua saída de casa em algo memorável, essa foi a lição que eu aprendi, e ela ficou tão marcada na minha mente, que "O Hobbit" virou o paralelo de uma bíblia para mim.
Agora eu espero a quarentena acabar para ingressar na minha próxima aventura, que você pode participar... mas só se quiser.
amo como vc escreve.
ResponderExcluirMe passa o número desse JR, ele concerteza é um gatinho
ResponderExcluirChorei com o texto
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