Amazonas de verdade

Resultado de imagem para dahomey amazons art"Difícil começar esse texto sem apontar um padrão que eu percebi durante essa fase de pesquisa. Eu já tentei escrever sobre mim mesmo mais umas duas vezes desde o primeiro texto, que aliás não é recomendado, mas acabo sempre desistindo e procurando por mais temas históricos ou geopolíticos para escrever sobre. E para unir o útil ao agradável, existe um poço de causos interessantíssimos no continente africano e asiático que nunca aprendemos na escola, porque, para nossa formação profissional e pessoal, é imprescindível que nós aprendamos também números complexos, triângulo de Pascal, teorema de Stevin e por aí vai.

A história de hoje é mais uma vez uma atipicidade bélica num reino africano¹, as amazonas de Dahomey (em português Daomé, mas eu não aceito que exista uma palavra tão feia na língua portuguesa)
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E como é praxe se tratando de lugares que você provavelmente nunca ouviu falar, o Reino de Dahomey não tem nada de importante na sua história além desse corpo militar². Porém, ainda é minha responsabilidade de dar o contexto histórico de toda situação:
Dahomey foi* um reinado na África que durou por volta de 1600 até 1894 (como também é de praxe), virando uma colônia francesa (liberdade, igualdade e fraternidade, como dizem) até 1960. 
Diferente de Zanzibar, não dá para rir muito do passado, porque eles tinham uma posição "chave" e uma certa influência no mercado de escravos, realizando trocas com os europeus e principalmente portugueses. E poucas coisas me deixam tão consternado quanto o fato de que o humano é capaz de escravizar e vender outro humano. 

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N’Nonmiton

Os europeus que passaram por lá, as chamavam de "amazonas", mas elas se chamavam "N'Nonmiton" que significa "nossas mães", mas não se enganem com esse nome carinhoso. Foi o primeiro esquadrão constituído somente de mulheres que se tem registros documentados, e também o único de toda a história militar do planeta. No seu auge, chegou a possuir 8000 guerreiras, que era mais ou menos 1/3 da força armada do rei. 

Dahomey’s female hunters, the gbeto, attack a herd of elephants.As fontes sugerem que elas começaram independentes e como caçadoras de elefantes lá no século XVII. Com sua bravura e habilidades notáveis, logo chamaram atenção do rei para uma possibilidade. Elas prontamente viraram gurdas reais (alguns registros europeus constatavam que elas eram geralmente julgadas como superiores ao corpo masculino do exército)

Depois de provar seu valor como guardas, elas ganharam também um posição no campo de batalha. Isso significa: agora que esses postos foram preenchidos, os homens jovens que eles capturavam na guerra contra outras tribos, eles vendiam como escravos. E Dahomey faturava absurdos com esse comércio.

Essa abertura foi essencial para a melhora de vida das mulheres da época, que era basicamente comparada com a de escravos (que eu me recuso a descrever aqui, porque, como eu já disse, isso me deixa muito triste). 

amazoana-dahomey-capMas esse desprezo pelas mulheres não se estendia de forma alguma para as guerreiras do palácio. Tendo alguns rituais tipo a saída do palácio, onde uma escrava tocava um sino pelo caminho onde elas percorriam, anunciando a passagem. Era explicitamente proibido que se olhasse para elas e se tocassem alguém da comitiva, a morte era certa. 

O processo de alistamento era diverso e bem incentivado, porque a vida de soldado era melhor que a vida doméstica em qualquer país da África. Chegando a recrutar garotas de até 8 anos para treinar a vida de guerra: estratégia, tiro, o uso do machete (a decapitação virou uma marca) e todo aquele misancene dos desfiles militares.

Outro "privilégio" (para mostrar que a história é cheia de verdade inconvenientes) era que toda recruta tinha direito a um escravo, aumentando a quantidade com a patente, chegando até 50 escravos.

No campo de batalha, elas eram muito superiores as outras tribos por causa de sua organização extremamente mais desenvolvida em comparação com os outros exércitos. Toda batalha que elas venciam, prendiam os jovens da tribo rival e os vendiam como escravos. Nunca se enganem, não existem heróis na história. 

A disciplina militar fanática vinha intrínseca no treinamento, junto da falta de piedade e resistência à dor, uma parte do treinamento era se jogar contra uma parede de espinhos para provar que elas não sentiam dor e não tinham medo. Outras eram treinadas em espionagem e por aí vai. 
Cerimônia pública que iniciava o treinamento, consistia em assassinar um prisioneiro jogando-o de uma torre. 
O reino seguia forte até que os cofres públicos secaram em 1850 com (alguém sabe o porquê?) a lei Eusébio de Queiroz, que proibiu o comércio de escravos. E como não existe botão reset na história, o país não conseguiu se recuperar e nem modernizar seu exército. Coisa que foi percebida pelos franceses, que começaram sua jornada colonial em 1890. 

Foram 23 batalhas antes da vitória francesa, em todas, as amazonas foram as últimas à se renderem, mas nunca desistiram. Algumas se vestiram como civis e fingiram cair nos encantos do oficias franceses, que sempre acordavam com sua garganta degolada pela própria baioneta. Mas a maioria morreu em campo de batalha. 

A última N’Nonmiton

Depois das invenções da tecnologia militar, não tinha nenhuma chance delas ganharem essa guerra, não só com machetes e mosquetes. 

Achava-se que a última amazona tinha morrido nessa guerra, mas uma historiadora que passava pela por um vilarejo na África, encontrou um senhorinha de 99 anos que se recordava de lutar contra os franceses em 1892 e sobreviveu para ver seu país, agora Benim, independente de novo. No ano seguinte, com 100 anos, morreu Nawi, a última amazona. 
  
  
Female officers pictured in 1851, wearing symbolic horns of office on their heads.

Bibliografia:

Amazons of Black Sparta: The Women Warriors of Dahomey – Stanley B. Alpern
Contraditorium 

Comentários

  1. Fato engraçado: se você as achou parecidas com os espartanos, não foi o único. Foi exatamente o que os europeus disseram quando descobriram sobre o treinamento delas.

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